A série de podcast Histórias Marginais trata daqueles colocados às margens da sociedade, dos condenados a não deixar rastros e cujas histórias chegam até nós devido ao fato de suas existências terem sido atravessadas pela experiência institucional. São trabalhadores e trabalhadoras rurais, operários e operárias, domésticas, menores, donas de casa, pessoas comuns, existências ordinárias que possivelmente não deixariam rastros ou vestígios evidentes. Mas que, devido a uma ruptura, um desvio, um choque com o poder, foram apreendidos pelo Estado, vigiados, controlados, e cujas histórias resultaram em um breve dossiê, que narra um determinado momento de suas vidas. Rastros fugidios que se perdem após a saída da instituição. Talvez tenham retornado para seus núcleos sociais de origem, talvez mudado de cidade, e as vezes podem ter inclusive se reinserido e retomado suas vidas deixando o passado desviante para trás. Mas os seus prontuários, o registro, o breve dossiê de suas vidas institucionais, seguiu nas margens e continua, mesmo na atualidade, retratando as margens da sociedade.
Para criar os podcasts nos apropriamos deste material – o acervo prontuários de sentenciados da Penitenciária de Florianópolis, mergulhamos nas vidas sem história que emergem dele. Sob a perspectiva da História Pública, nos interessamos pelos processos de construção de produtos que visam atingir uma audiência mais ampla. Assim, os caminhos tecidos no processo de construção dos podcast são tão importantes quanto o seu resultado. “Histórias reais atravessadas por experiências em hospitais psiquiátricos, prisões, reformatórios e leprosários”.
Atendendo a preocupações éticas, usamos em nossos episódios somente pseudônimos. Na primeira temporada, nossos personagens serão chamados por nomes de prisões do Brasil e do exterior, indicando que essas histórias marginais poderiam fazer parte de qualquer um desses lugares.
O formato é o de storytellealing não ficcional, criando um pacto com o ouvinte que procura aquilo que move muito da curiosidade humana, o famoso “based on a true history”. O gênero da primeira temporada pode ser classificado como “true crime”, crimes baseados em casos reais. Mais que isso, tratam-se de episódios totalmente construídos a partir de fontes históricas, o que permite aos interessados acompanhar o processo de criação de um produto a partir da matéria prima da operação historiográfica. Não apresentamos soluções aos crimes, nem histórias com desfechos, também não dramatizamos e não julgamos. Trabalhamos com o que foi dito, com os registros inscritos nas fontes. Não estamos aqui buscando uma neutralidade impossível (e indesejada) ao historiador, a própria escolha do tema já mostra nosso compromisso em trazer à tona as histórias de vidas, as construções narrativas, as possibilidades de compreensão dos espaços de confinamento a partir de uma visão de dentro para fora das instituições. Uma experiência auditiva voltada principalmente a jovens ingressantes nos cursos de história, mas também a um público amplo interessado na temática.
Projeto aprovado pelo comitê de ética em pesquisa em 26 de Abril de 2021 (parecer 4.670.48).